Com os retalhos antigos de Fernando Pessoa
Sou um velho a tecer uma colcha
Colcha velha de sentimentos novos
Para escapar do frio e da solidão dos mortos
Posso me sentir renascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...
Ontem estive feliz, hoje um sórdido taciturno.
Sei que te amo e isso ainda me dá um sentido
Creio no mundo, na esperança.
Como uma eterna flor,
Na última pétala um malmequer...
Apesar disso te amo,
E necessito constantemente te ver
Porque ver é bem mais que pensar
Teu corpo não foi feito para que eu pensasse nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para admirá-lo e estar de acordo...
(agora que já não posso tocar)
Descubro que não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo do que sinto por ti não é porque consigo entender,
Mas porque te amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca pensa por que ama,
Nem o que é amar...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar...
Ao te perder sinto,
Já não ter mais alma. Doei-me a escuridão e ao silêncio,
Só sinto um vácuo imenso onde alma um dia tive...
Sou qualquer coisa de exterior,
Consciente apenas de já nada ser...
Pertenço agora à paródia e à crápula da noite
Sou só delas, encontro-me disperso.
Por cada grito de desespero, por cada pranto de dor.
Por cada pele lacerada pelas unhas
Tom de luz no amplo clarão da penumbra.
Participo agora da névoa luminosa
Da orgia e da falsa alegria do prazer distante de ti.
E uma febre e um vácuo que há em mim
Confessam-me já morto... Palpo, em torno.
Da minha alma, os fragmentos do meu ser,
Com o hábito imortal de perscrutar-me.
Sem ti
Não sou, não sei, não tenho.
Apenas sinto a eterna falta de não sentir
Não mais, não mais, e desde que saí,
Desta prisão fechada que é a liberdade do mundo,
Meu coração é inerte e infecundo
E o que sou é um sonho que está triste.
Porque há em nós, por mais que consigamos
Ser nós mesmos a sós sem nostalgia,
Um desejo de termos companhia -
Que nunca será preenchida por um Amigo.
Sendo assim, melhor a chuva que a proteção de um abrigo