Mediunidade em Busca de Equilíbrio - Tributo a Fernando Pessoa!



Escrevo-lhe hoje por uma necessidade sentimental - uma ânsia aflita de falar contigo. Como de aqui se depreende, eu nada tenho a dizer-lhe. Só isto - que estou hoje no fundo de uma depressão sem fundo. O absurdo da frase falará por mim.
Estou num daqueles dias em que nunca tive futuro. Há só um presente imóvel com um muro de angústia em torno de mim. A margem de lá do rio nunca, enquanto é a de lá, é a de cá; e é esta a razão íntima de todo o meu sofrimento. Há barcos para muitos portos, mas nenhum para a vida não doer, nem há desembarque onde se esqueça. Queria estar do teu lado, mas os ventos da vida me afastam de ti. Tudo isto aconteceu há pouco tempo, mas a minha mágoa é mais antiga.
Em dias da alma como hoje eu sinto bem, em toda a minha consciência do meu corpo, que sou a criança triste em quem a vida bateu. Puseram-me a um canto de onde se ouve brincar. Sinto nas mãos a liberdade que me destes por uma ironia de lata. Hoje, dia dezesseis de agosto, às três e meia da madrugada, a minha vida sabe a valer isto. Bem menos que o nada.
Pouco mais ou menos isto, mas sem estilo, é o meu estado de alma, neste momento. Como à vela do "Marinheiro" ardem-me os olhos, de ter pensado em chorar. Dói-me a vida aos poucos, tomá-la aos goles, viver de brechas. Tudo isto está impresso em tipo muito pequeno num livro com a brochura sem sentido, quer ler? O faça num espelho.
Como sou EU quem escreve, preciso jurar que esta carta é sincera e que tudo que há nela são sentimentos verdadeiros, afinal jura-se apenas para quem duvida. Mas você sentirá bem que esta tragédia irrepresentável é de uma realidade de chá em xícara, de aqui e de agora, e passando-se na minha alma como o verde nas folhas e o azul do céu.
Foi por isto que o Rei não reinou. Esta frase é inteiramente absurda. Mas neste momento sinto que as frases absurdas dão uma grande vontade de chorar.
Te amo! Se não acreditas! Tentes ao menos imaginar!