Eu quis escrever, mas não pude. Eu quis te dizer tantas coisas e não fui capaz de pronunciar nem meia dúzia de palavras banais. Ouvi distraidamente as tuas histórias. Entendi, enfim, aquela frase meio clichê que diz que em alguns momentos da vida as palavras são desnecessárias. Cheguei à conclusão de que toda aquela explicação, nas aulas de português, sobre o que é abstrato, tornou-se perfeitamente descartável. O abstrato é inteiramente concreto. Concreto em gestos, beijos, abraços, suor, suspiros e gemidos... O sentimento é palpável, tangível, audível, visível a olho nu. Tem o doce sabor dos teus lábios, a suave melodia da tua voz e o calor da tua pele. Esse sentimento, impossível de se dizer em palavras, tem sorriso, às vezes largo, às vezes torto, cabelos desalinhados, uma barba bem feita, e nenhuma poesia no mundo faz mais sentido do que a poesia que é estar perto de ti. Olhos nos olhos, mãos que se tocam e meus pés sobre os teus. Cheios de uma intimidade repentina, leve, despreocupada e bem humorada. Amigos e amantes na mesma medida. É bem verdade que eu estremeci quando tu disseste “- isso aqui é de verdade”, e quase deixei que uma lágrima se perdesse face abaixo, não sei se por medo ou dúvida. Nesse exato momento tento justificar a minha covardia, repetindo mentalmente que é natural temer aquilo que desconhecemos. Agora que estamos distantes, tudo que eu queria era ouvir aquela palavra “amor” que tu disseste outro dia – pela primeira e única vez - meio sem querer. Queria te ouvir dizer novamente que o que aconteceu entre nós é de verdade ainda, e queria poder acreditar nessa verdade, que nunca, nem por um momento questionamos com palavras ou atitudes; mas que por todos aqueles motivos que eu conheço e tu também, fica difícil acreditar... Ontem choveu e eu pensei nas palavras não ditas, pensei que talvez elas pudessem mudar o rumo da nossa história, mas não, eu sei que não, foi apenas uma centelha de esperança que fez meu coração disparar por uns breves segundos, um coração já meio partido. Uma história assim, sem meio e sem fim... Pensando bem, nem foi uma despedida de verdade, pois não dissemos adeus. Eu, porque fui covarde, e tu, por não saber que era uma despedida. O sentimento é apenas abstrato outra vez, inalcançável, intangível... Um sentimento que nem por isso deixa de ser grande, gigante aqui dentro de mim - embora constate que mais uma vez esqueci teu rosto - e eu posso ainda respirá-lo enquanto sinto a saudade oxigenando meus pulmões com vida e dor, e dessa vez, só dessa vez, enquanto escrevo, eu permiti que aquela lágrima se perdesse.
Nirléia Lima