Outubro dos Anjos, novembro dos mortais


Sou um menino de recados
Dos ventos e das nuvens trago relatos
Um mensageiro celestial
Dos que falam das coisas da alma
Não trago noticias da casca,
Não sei nada da pele, de maquiagem e nem da matéria
Não conheço marcas, etiquetas ou cédulas
Sou de um tempo em que ainda não tinham dado preço pra tudo
De uma época em que  a palavra tinha mais valor que um contrato surdo
Estou cheio do sentido que te faz falta
Me sobra as respostas sobre as quais não sabes tu de nada
Sou, por assim dizer, o último parágrafo do livro que lias
Daqueles que ao terminar não soubestes mais o que fazer da vida

Interpreto o canto dos passarinhos
Ao lado do meu gohonzon, toco o sino
Do cometa, sou o canto perfeito
Da tempestade, trago o ar rarefeito
Trago um presente para o teu passado
Um feriado para o teu maior cansaço
um elogio para o teu esforço
um sorriso para o teu desgosto
Para os teus murmúrios trago um beijo
Para a tua goiabada, um queijo
Trago um trevo para a tua má sorte
E pra quem está sozinho, de repente, trago um consorte
Para o teu sono, trago uma cama
Para a tua angústia, trago um mantra

Para quem tem fome, trago uma laranja madura
No bolso, trago um arco-íris pra conter a chuva
Pra quem acorda cedo, trago uma Sol maior
Pra quem espera pra sair do trabalho, dou um Dó menor
Trago um trago para as tuas mazelas
E para o desemprego, páginas amarelas
Te dou um vale bom sonhos quando estiver dormindo
Em troca do teu Eu sozinho, por um nós domingo
Para um dia frio, trago cobertores e livros
Para um dia quente trago o mar
E um navio para você ver passar
Enquanto eu também passo
Do infinito ao ocaso

Da carne, de anseios e desejos
Fiz destes, meu maior ensejo
Ao conhecer a tua humanidade
Quis entender a tua liberdade
Pelo pudor, me tornei impuro
Pela mortalidade me tornei inseguro
Pelo vinho me embriaguei
Pelo teu olhar me apaixonei
Das nossas escolhas ficam as saudades, e o arrependimento
Se tens por mim, demonstre agora teus sentimentos
Ao invés deles, reinou o silencio
Difícil é não saber terminar
Quando já não se tem mais nada a falar

Agora só falo do tempo, da solidão e dos novembros.